Inscrevi-me na ginástica. As aulas são em grupo. Estava rodeada de pessoas mais velhas e não acertava um único passo. Senti-me tal e qual a Baby no Dirty Dancing quando ela vai àquela primeira aula de dança dos velhotes, logo no início do filme. Éramos todas mulheres, todas com o seu pneu ou a sua celulite, todas mais ou menos descoordenadas, fatos de treinos e calções fora de moda. Tive vontade de sair dali e ir para o sítio onde as pessoas cool fazem ginástica, mas depois pensei no ginásio que frequentei há uns anos e lembrei-me que ali também não havia gente cool. Um bocadinho mais bem parecidos, talvez, mas tão normais como eu. No final da aula, reunimo-nos na casa-de-banho e o tema dominante da conversa foram os cremes anti-estria. Nunca me senti à vontade a andar por entre corpos nus femininos, de toalha na cabeça, por isso tentei despachar-me com rapidez e não participei na conversa. Mas comoveu-me aquilo. Comoveram-me aqueles conselhos de veracidade duvidosa, aqueles corpos tristes, cheios de dicas para dar e receber. Não fazem séries sobre nós. Alguém devia fazer uma série sobre nós e tornar-nos as heroínas, assim mesmo, em fatos de treino e calções fora de moda. Ocasionalmente mais bonitas, de vestido. Com namorados também com o seu pneu, a sua careca, eventualmente com uma roupa e um sentido de humor sexys. O genérico da série começaria com um poema da minha infância de Ribeiro Couto. O poema, quando eu o conheci, estava escondido num LP velhinho dos meus pais, e de lá saía a voz do Villaret que, de uma forma deliciosa, dizia: Esta menina gorda, gorda, gorda, tem um pequenino coração sentimental. Seu rosto é redondo, redondo, redondo, toda ela é redonda, redonda, redonda, e uns olhinhos estão lá no fundo a brilhar. É menina e moça. Terá quinze anos? Umas velhas amigas de sua mamãe dizem sempre que a encontram, num êxtase longo: -Como esta menina está gorda, bonita! E ela ri de prazer. Seu rosto redondo esconde os olhinhos, no fundo a brilhar. Às vezes, no quarto, diante do espelho, ao ver-se assim tão gorda, tão gorda, tão gorda, ela pensa nas velhas amigas de sua mamãe e também num rapaz que a olha sorrindo, quando toda a manhã ela vai para a escola: - Ele gosta de mim... ele gosta de mim!... Eu sou gorda, bonita!... E os dedos gordinhos pegando nas tranças, têm carícias ingénuas diante do espelho.
Não era genial?
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