14 janeiro 2013

Lembro-me de à noite, já deitada na cama, tentar sincronizar a minha respiração com a da minha irmã. Era um jogo que ao mesmo tempo me divertia e me embalava. Isto passava-se no meu primeiro quarto, o quarto do nascer do sol e que era também o quarto da árvore, aquela que não media mais do que a altura de um adulto pequeno quando os meus pais se haviam mudado lá para casa e que durante a minha infância dera um salto tão grande que já espreitava pelas janelas do quarto, localizado num quarto andar. O nosso quarto era tão grande que uma vez montámos uma tenda para quatro pessoas lá dentro, entre as nossas duas camas, uma secretária, dois armarios e um estirador. Os miúdos raramente precisam de muito espaco para sonhar, mas nós tínhamos muito espaço e gostávamos de o partilhar. Aos 15 anos mudei-me para o quarto do pôr-do-sol, que era também o quarto azul e o quarto dos livros. Nesta altura, lia facilmente um livro por semana e, por isso, as manhãs de fim-de-semana eram passadas habitualmente a escolher de entre as centenas de livros nas estantes, aquele que seria o livro eleito para aquela semana. Os meus pais dividiam as prateleiras dos livros do quarto azul em várias categorias e, dentro de cada categoria, por ordem alfabética de apelido do autor. Esta seria também a maneira como eu, 10 anos mais tarde quando saí de casa e ainda hoje, continuaria a organizar os meus próprios livros. A manhã em que escolhia um livro era muito entusiasmante. Nunca escolhia um livro só. Em vez disso, pegava em dois ou três e mais tarde nessa manhã fazia a selecção definitiva. Ainda mais do que agora, cada livro era um mundo onde mergulhava sem reservas, de pés e cabeça e só saía no final da última página, quer o livro fosse do meu agrado ou não. Hoje já não consigo ler um livro que não seja do meu agrado, não há nenhuma árvore a espreitar pela janela e tão pouco consigo sincronizar a minha respiração com a dele. O quarto já não é grande, é pequeno. Mas a magia continua. Comigo tenho o Tejo, a ponte e as estrelas, o calor do seu corpo no meu e dois corações em vez de um.

4 comentários:

recaredo disse...

lembro-me com nostalgia do quarto azul (vírgula) dos livros (e) do pôr-do-sol... e como me conforta perceber q enqto tudo muda, tudo aquilo q nasce e cresce sob a redoma do amor e do carinho tb permanece!

recaredo disse...

ah!... e benditos aqueles livros, q te fizeram escrever assim :)

Sofia disse...

Boas recordações contigo naquela casa também! :)

Sofia disse...

P.S. Éramos tão pequeninos! :)