29 março 2012

Na esquina da rua que vai dar à escola da minha sobrinha, há um alfarrabista. A loja é deliciosa; todas as paredes estão forradas de livros literalmente do chão ao tecto e mesmo as janelas têm livros a emoldurá-las, o que faz sombra para dentro da loja. Para além do mais, o espaço é grande, estendendo-se ao comprido por três salas. O senhor alfarrabista é, pelo menos, tão velho como alguns dos livros e também bastante surdo, o que faz com que as nossas conversas sejam habitualmente absurdas. Como não é particularmente simpático, culpa-me a mim pelos rumos desviados da conversa e eu acabo invariavelmente a rir. Gosto de ir lá, claro. E gosto do velho antipático e surdo. O preço em cada livro está marcado em escudos, habitualmente um preço ridículo, tipo 300 escudos ou 10 escudos e em baixo, mantendo a tradição, e portanto a lápis, o preço em euros, resultado de alguma reavaliação mas ela também já antiga, porque de forma geral os livros são todos muito baratos. Hoje andei com os olhos e os dedos por edições esgotadas do Augusto Gil, poeta preferido e amigo do meu avô. Duas dessas edições tinham ilustrações tão bonitas que eu tive de as comprar. Agora tenho os livros na mesa de cabeceira e comovo-me em cada página, não pela poesia em si, mas pelo velho alfarrabista, pelas edições esgotadas e pelo meu avô.

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